
Entre fios, agulhas e novos sonhos, 25 mulheres privadas de liberdade deram o primeiro ponto para reescrever suas histórias. Assim foi o encerramento do curso básico de renda irlandesa, concluído na manhã desta terça-feira, 2, no Presídio Feminino de Sergipe (Prefem), que capacitou internas na técnica artesanal reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil.
A conclusão marca também a realização do primeiro curso de renda irlandesa dentro do sistema prisional feminino de Sergipe, consolidando uma iniciativa inédita voltada à ressocialização e à geração de renda. O projeto é fruto da parceria entre a Secretaria de Justiça e de Defesa do Consumidor (Sejuc) e a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), por meio do programa SerMulher Qualifica, que uniu tradição, capacitação e oportunidade concreta de autonomia econômica para as participantes.
Sobre o curso
A capacitação foi ministrada pela instrutora Neidiele Silva ao longo de dez encontros iniciados no fim do último mês de outubro. As internas aprenderam técnicas básicas como alinhavo, ponto ilhós, redinha, barrete e ponto aranha, além de estudarem modelos de peças, noções de precificação e possibilidades de comercialização. Como avaliação final, cada participante confeccionou um colar utilizando os pontos aprendidos.
Para a diretora do Prefem, Mônica Barreto, a formação representa um avanço significativo no trabalho de ressocialização. “Trabalhar a autonomia econômica dessas mulheres significa abrir portas reais para que elas reconstruam suas histórias. O envolvimento e a dedicação de cada interna mostram o quanto iniciativas como essa fazem diferença no caminho da reintegração social”, declarou.
O resultado das peças confeccionadas surpreendeu a equipe, que decidiu dar continuidade ao projeto com a criação de um módulo intermediário já para o próximo ano. Sobre esse avanço, a diretora de Inclusão Produtiva e Autonomia Econômica da SPM, Gabriela Fonseca, destacou o compromisso da pasta de ampliar a qualificação.
“Foi uma alegria imensa participar desse processo. Percebemos o potencial dessas mulheres e a qualidade do material produzido. Já estamos comprometidas a dar continuidade à turma no próximo ano e a abrir uma segunda turma no período da tarde. A renda irlandesa é altamente rentável, e nossa missão é garantir que elas saiam daqui com uma profissão e perspectiva de futuro”, afirmou.
A instrutora Neidiele Silva reforçou o valor cultural do aprendizado e relatou a experiência transformadora vivida no Prefem. "A Renda Irlandesa é um patrimônio vivo de Sergipe. Cada ponto carrega história, tradição e resistência. O curso foi muito proveitoso, todos aprenderam as técnicas básicas e demonstraram grande capacidade. Para mim, foi uma experiência transformadora. A gente desconstrói preconceitos e enxerga mulheres com enorme potencial de recomeço. A ideia agora é iniciar um módulo intermediário para que o conhecimento avance e não fique parado", salientou.
Entre as participantes, o clima era de orgulho e esperança. Uma das internas, que preferiu não ser identificada, relatou o impacto da formação em sua perspectiva de futuro. "Eu nunca imaginei aprender algo tão bonito. Cada ponto que fiz foi como um reencontro comigo mesma. Agora eu sei que posso ter uma profissão quando sair daqui. Isso me dá esperança”, revelou.
Renda irlandesa
A renda irlandesa é uma técnica artesanal de origem europeia, trazida ao Brasil no século XIX, que encontrou em Divina Pastora, município do leste sergipano, um novo lar e identidade própria. Produzida com agulha, linha e muita delicadeza, ela se destaca pelo uso de cordões mais sedosos e encorpados, característica marcante da tradição sergipana.
Reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, a renda combina habilidade manual, criatividade e memória histórica e ainda se consolida como uma importante fonte de renda para inúmeras artesãs do estado, preservando um legado que atravessa gerações.



